19 de jul. de 2009

Sobre decidir


Até a algum tempo, eu pensava que definir fosse a ação mais difícil para o ser humano. Contudo, depois de determinadas experiências, mudei minha opinião. Realmente, as definições são complicadas e bastante relativas, mas o que, de fato, nos faz sentir pequenos demais na imensidão do mundo é uma palavra de apenas três sílabas: decidir.

As decisões implicam em escolhas. Escolhas implicam em perdas, que em maior ou menor proporção, nos causarão algum tipo de sofrimento. Por isso, talvez o grande dilema do ser humano seja que, desde que temos o mínimo de senso de existência, estamos obrigados a decidir e, claro, a perder. E pior ainda, somos inteiramente responsáveis pelas escolhas que fazemos e pelos seus prejuízos.

É claro que isso não nos afeta em maior grau todo o tempo e que aprendemos a lidar com as escolhas de maneira inteligente ao longo do tempo. Não obstante, a questão é quando estamos diante das decisões mais intensas da vida. No tempo em que ninguém pode ajudar ou opinar. Quando uma escolha pode mudar a sua vida inteira e te fazer virar outra pessoa.

Contudo não parece muito conveniente deixar tudo que se construiu para trás e escolher um caminho diferente, se a comodidade do estável nos seduz tanto. Por isso, muitas, muitas vezes mesmo, vamos protelando as decisões e deixando para um tempo desconhecido e remoto as escolhas que o nosso coração reclama, por medo de sofrer; e assim, nos esquecemos de que a própria indecisão já é um sofrimento real e quase uma tortura.

Na verdade, parece que sempre sabemos o que fazer, mas permanecemos imóveis, paralisados pelo medo, pelo receio, pelo terror do desconhecido. O que impressiona mais ainda é o fato de não temermos a dor que já nos aflige no tempo presente, quase física e que repete de hora em hora (ou de minuto em minuto) que existe algo urgente para ser feito.

No entanto tememos as dores de um futuro que nem existe ainda. Preferimos a dor do agora à sensação do desconhecido.

Por isso, hoje, se eu tivesse direito a um desejo, eu gostaria de poder escolher sem o fatídico medo do erro. Eu gostaria de fechar meus olhos, como que caminhando sobre uma ponte que não pode ser vista, e acreditar tão somente na plenitude de Deus. Porque se nós compreendêssemos, por apenas alguns instantes, como a presença divina nos ampara, não teríamos medo de ir a parte alguma, não teríamos medo de recomeçar ou de simplesmente dizer não. Não teríamos medo de ser quem somos.

Li um texto* há algum tempo que falava sobre felicidade. O autor diz ter ouvido o sermão de um pastor o qual contava que os insetos só percebem duas dimensões, ou seja, eles só enxergam de frente e de lado e não conseguem perceber nada acima de suas cabeças. O exemplo que o pastor usa é que se jogarmos um copo de água sobre o inseto, ele não saberá de onde veio a água, ele vai tão somente senti-la. Esse exemplo para mostra a presença de Deus nas nossas vidas. Não podemos saber de onde ou como Deus vem até nós, mas podemos senti-lo completamente, podemos ficar encharcados Dele.

Sou apenas um ser humano minúsculo nesse mundo imenso. Mas sei que, se caso eu deixar o meu medo ter menos força que minha vontade e resolver mudar tudo, sentirei a água encharcar meu corpo todo e uma voz suave a me dizer: “pode ir filho, estou contigo”.

* Só os cafonas são felizes – Carlos Nader.

15 de jul. de 2009

Blog Cinza das Horas

Meus queridos!

Quero comunicar as vocês, meus leitores 'gatos pingados', que criei um outro blog com um estilo um pouco difereciado deste, mas com a mesma essência.
A partir de agora vou escrever com menos frequência aqui no 'Cacos para um Vitral', mas não vou abandoná-lo.

É uma honra ter vocês sempre comigo!
Peço que me visitem no meu novo endereço:




http://blogcinzadashoras.blogspot.com/



Um beijo doce!
Érica











28 de jun. de 2009

Sobre Arte!

_ Segundo o dicionário Houaiss, arte é a "produção consciente de obras, formas ou objetos voltada para a concretização de um ideal de beleza e harmonia ou para a expressão da subjetividade humana".



_ Acho bonito um poema, mas, não sei pra que serve!



_ Falta arte ao mundo! Se todas as pessoas soubessem a importância, tivessem sensibilidade e praticassem, não haveria tanta violência, tantas mazelas, tanto egoísmo. Todos procurariam valorizar as coisas simples da vida e não se deixariam seduzir pela vaidade. Quem sabe o valor da arte, respeita o próximo e vive em prol de um mundo melhor.



_ As minhas aulas mais chatas são sobre arte. Porque não estudamos apenas as matérias úteis, como física, matemática e geografia? Ficar falando de coisas que já aconteceram no passado... Arte para mim é só isso! Humpf!



_ Arte tem a ver com história. Isto porque a história se releva através da Arte e a Arte se revela através da história.




_ Arte é só um ‘hobbie’. Aliás, nem tudo que é bom para você é bom para todos. Se a arte serve pra você, então seja feliz assim. Mas para mim arte não serve para nada! Acredito no poder do dinheiro.



_ Música para mim não é simplesmente para alcançar fama. Música é um conjunto harmônico composto por letra, melodia e sentimentos. O sucesso financeiro é mera conseqüência. O músico ‘mercenário’ é aquele que identifica tendências, imita estilos ao invés de se inspirar. Com isso, às vezes até impõe comportamentos, através da repetição. Já o músico ‘artista’ é aquele que se deixa levar pelas emoções, é dedicado, tem tino, dom. A música é minha vida.



­_ Não será por intermédio de poemas que o mundo vai progredir.


_ Sou cinéfilo! O cinema é um modo divino de contar a vida.


_ Surrealismo é a libertação dos impulsos em forma de arte. A vitória sobre a censura do subconsciente!


_ Não gosto de ler!


_ Música é sentimento exteriorizado, fruto de um momento de inspiração. Queria compor uma música. Quem não gosta de arte não tem sentimentos.

_ A arte é vida. Pessoas que não gostam de arte são como “gado”. Não passam de um imenso agrupamento de pessoas, em torno de idéias que não foram inventadas por elas. Elas não se posicionam de forma contrária, porque não possuem capacidade intelectual, para tanto. Simplemente aceitam tudo! Tudo que está na moda, tudo o que os outros dizem que é bom! Não têm individualidade. Estão sugestionados pela massa. São “Outros”, conforme disse Manoel de Barros, em certo poema.


_ Não gosto de teatro! É tudo invenção e mentira. É muito caro, gasta-se muito dinheiro com peças teatrais. As pessoas aplaudem uma peça por mera hipocrisia.


_ Sou fotógrafo! Fotografia é a "arte de escrever com a luz".

_ Gosto de qualquer música! Na verdade, gosto mesmo é de baladas! Qualquer música em companhia da minha paquera fica perfeita.


_ Ora, para mim, o teatro é a arte em sua plenitude. É mágico estar em um palco, é fascinante decorar textos, criar figurinos, dar vida ao personagem! Eu nasci para o teatro! Atuar é doar-se em nome de um sonho. Atuando posso ser o que quero! Sou diferente, pois sei criar, ensaiar e me orgulho de cada trabalho que faço! É como um nascedouro de um novo filho! Um filho meu! Encontro-me na arte teatral!



(Diálogos extraídos de um grupo de debate sobre Arte que não existiu, mas que é verdadeiro).


Por Érica, a sonhadora.



A literatura foi o meu primeiro amor. Para mim, a arte vem de Deus, tem um toque divino. Tem poder de mudar vidas, já que transcende os desígnios do cotidiano e encontra forças no que há de mais bonito na alma humana. Escrevo com meu sangue, parafraseando Nietzshe. Escrevo para me encontrar. Quero que meu último suspiro seja por Deus e pela Arte. A literatura, a meu ver, é como um pequeno caco. E a arte como um vitral. Cacos juntos formam um vitral para que raios de sol por ele passem. Contas de vidro coloridas, pequenos pedaços de mim. Cacos para o vitral da minha vida. Retalhos que dão sentido à minha existência. A arte para mim é amor. Um mundo de amor em mim.

23 de jun. de 2009

Outono (por Paulo Honório)




Para a Érica,

Acho que nunca pensei nele seriamente, ou nunca no sentido de querer saber qualquer coisa dele. Ele nem é tão característico para quem vive nos cerrados brasileiros, quer dizer, até pode ser: as chuvas diminuem; os dias vão ficando menos quentes e mais curtos; o vento da tarde já trás consigo algo de frio, o verde vai dando lugar ao amarelo, ao palha; as mexericas já podem ser colhidas e o principal: a seca vai chegando devagar até se tornar ela própria o inverno e quase toda a paisagem. De qualquer forma nunca havia me atentado a ele. E ele se foi ontem ou anteontem, tal como muito de nós se perde sem ser percebido ou entendido. Foi-se o Outono, veio o Inverno, o mesmo que não me gerou, mas no que nasci. O das férias geladas de julho, dos pés frios e às vezes de meia, da fumaçazinha que sai da boca quando se vai para a escola cedinho, dos banhos corridos, dos muitos cobertores, do preguiçoso acordar, da cama quentinha e do prazer de ser aquecido. O Outono é passado e só o que resta é esse frio com o sol quente que faz com que a poeira de Brasília se torne redemoinho e também canção, beleza, morte e no fim, lá no fim dela mesma, vida. Até porque dizem que "a flor da cagaiteira não cai na poeira..."

http://paulohonorio.zip.net/






Sou apaixonada pelo Outono, mas sabia que não conseguiria escrever sobre ele, como se deve, à altura de seu esplendor. Por isso, pedi ao Paulo que escrevesse sobre o outono, e como se vê, ele cumpriu essa tarefa como muito louvor... lindamente!

Paulo, meu querido amigo, meu "vento solar e estrelas do mar"... obrigada pelo presente! Para mim você é ainda mais lindo que o outono: é meu raio de sol, meu girassol, meu vento solar e estrelas do mar...

16 de jun. de 2009

Amor e Poesia



E o inusitado acontece. Aquela noite não prometia nada demais. Apenas iria a uma festa acompanhando uma amiga que há muito tempo vinha insistindo. Avistou-o de longe e reparou a sua beleza. O primeiro atributo a ser analisado, mas, no fim das contas, o último a ser considerado. Ele, sorridente, apresentou-se e eles descobriram afinidades. E eram tantas. De família, de gostos, de sorrisos, de carinho...


Veio o convite para a dança. E com os rostos colados silenciaram. A magia condensada naquele momento dispensava palavras, era para ser adorada e cultuada em silêncio, “como quem ouve uma sinfonia... de silêncio e de luz.”.


Ele tentou beijá-la, mas sentiu-se tão maravilhado pelo sorriso dela que desconsertou-se. Adiou aquele momento que minutos depois aconteceu inevitavelmente. Ele mexeu nos cabelos dela e sentiu um leve perfume. Aquela fragrância eclodiu dentro dele um breve desvario, e ele teve que conter sua impetuosa vontade de beijá-la, por completo. Ela, também atraída, aninhou seu corpo junto ao dele... sentiu tudo tão familiar. Olhos nos olhos, mãos se entrelaçando. O corpo é instrumento e o amor é poesia.



Não queriam se separar, mas foi preciso. Em casa ela demorou a dormir tendo em suas mãos um livro de poemas de Pablo Neruda. Ele dormiu embalado pelas carícias que o amor lhe fazia nos pensamentos.





E eles eram mais antigos que o silêncio...



Quando falo sobre amor, lembro de Florentino Ariza, personagem do livro “O Amor em tempos de cólera”, que demorou 53 anos para conquistar o amor de sua vida e como disse Rubem Alves, com muito encantamento, a partir de então, viveu o ‘tempo da delicadeza’. Algumas pessoas, por outro lado, passam pela vida e não encontram o amor. Outras o encontram, mas o perdem. Existem aquelas como os personagens da pequena história que narrei, que vivem curtos momentos gloriosos de amor. Encontram o momento de amor. Amor que será colocado à prova posteriormente quando o casal passar horas e horas a fio conversando, descobrindo afinidades ou destemperanças.

A beleza que foi o primeiro atributo será mais valiosa, se junto com ela vier a cumplicidade. Em verdade, existem muitas belezas, mas, a beleza da alma nunca fenece. Diferentemente da beleza física e a do sexo, que são fugazes, a beleza do amor é a mais bonita de todas. É aquela em que o casal vê nos olhos do outro, os seus sonhos e a sua própria imagem revestida com uma ternura embalsamadora. É poesia, e por isso permanece.

Durante a dança, mais que o encontro dos corpos, houve um momento em que os sonhos se encontraram: o sonho de ser feliz, de viver uma história, de livrar-se da solidão, de estar sempre no ‘tempo da delicadeza’. Eles se amaram, e mais que isso, amaram o momento. Amaram “a água implícita, o beijo tácito e a sede infinita”, como muito bem escreveu Drummond em um de seus poemas.

7 de mai. de 2009

Amigos





Eles se entendem pelo olhar
Inefável ternura fortalecedora
São intensos, divertidos e emotivos
Livres, mas, presos por laços espirituais
O tempo é testemunha
Ela, doce e rígida ao mesmo tempo
Ele, convincente e implacável
Um porto seguro
Amigos também são almas gêmeas
Eles se completam.





"... mas há um amigo que é mais chegado do que um irmão.” (Provérbios 18:24)










Ela é sorridente e simpática, o encanto é instantâneo
É cheia de graça e de amor
Guarda as dores (quase que só) para si
Juntas não sentem o tempo passar
Mergulham em poemas, música, arte e confissões
Tudo regado a vinho tinto
A distância não as separa
O reencontro sempre desperta as afinidades
São irmãs de coração.
“A distância não separabólica”.







"O amigo ama em todo o tempo: na desgraça, ele se torna um irmão. (Provérbios 17, 17)".








Ele é leal, cortês, um perfeito cavalheiro
Perseverante e dono de sentimentos nobres
Firme em suas opiniões
Eles são confidentes
Delongam horas com filosofias próprias
Respeito e confiança são marcas constantes
A diferença é o que se tem em comum
Sonham em se abraçar
Mais que amigos virtuais
Amigos de fé
Unidos por laços invisíveis de carinho.





"Azeite e incenso alegram o coração: a bondade de um amigo consola a alma.". (Provérbios 27, 9)







Esta é uma singela homenagem aos meus amigos: Saulo, Nayara e Felipe. Com carinho...











24 de abr. de 2009

Protegendo a cria


1965. Era de manhã. Ela acordou cedo porque o bebê já queria leite. Pouco mais tarde os filhos maiores acordaram um a um e já começavam os afazeres diários. Perguntaram pelo pai que há dias havia ido para o combate. Ela amoleceu o olhar e balançou a cabeça com um sinal negativo. Um estrondo ensurdecedor denunciou que aquele sossego tenso e melancólico havia chegado ao fim. Ela juntou os filhinhos e sem nenhum de seus bens empreendeu fuga. Resolveu passar pelo rio, ali, talvez não fossem atingidos pelos bombardeios americanos. Devia haver neste mundo torpe um local onde pudesse abrigar sua cria, tapar-lhe os ouvidos, abraçá-los tão fortemente, a ponto de nenhum mal poder atingi-los. Protegê-los, niná-los, dizer que tudo estava bem... tudo aquilo era um sonho ruim!




A pequena história que narrei é fruto de minha imaginação. Estou há dias observando essa fotografia e fiquei imaginando o que teria acontecido à essa pobre família, antes de chegar a essa trajetória fatídica. Muito embora a história narrada seja por mim fantasiada, os personagens são reais e eles estavam dentro de uma guerra real. Ninguém posou para essa foto, todo esse desespero estampado no rosto de cada uma das vítimas foi real.

Durante dez anos, as fotografias da Guerra do Vietnã foram eventos principais nas manchetes dos jornais de todo o mundo. É que o acesso aos campos de batalha era praticamente irrestrito, e por isso, os foto-jornalistas conseguiram mostrar a guerra no seu âmago, em sua essência indolente e cruel. E foi uma guerra com muitas batalhas, não obstante o uso efetivo de armas de última geração, inclusive químicas, bombas de fragmentação e as famosas bombas de napalm, por parte dos Estados Unidos. Frise-se, que ainda assim, mesmo com todo esse acervo armamentista, os norte-americanos não obtiveram triunfo, sendo, ao final, derrotados pelos experientes vietcongs e suas táticas de guerrilha. Um espetáculo de horrores prontinho para ser registrado!

Não só na Guerra do Vietnã, que foi o palco das tormentas sofridas por essa família, bem assim, em todas as guerras, a covardia, o sofrimento imensurável, o sadismo, são figuras dominantes. E além dos soldados que são obrigados e convencidos a lutar em nome de uma ideologia infame, sofrem também as mulheres, as crianças e toda uma nação é destruída.

O meu intuito em publicar essa fotografia, que já foi inúmeras vezes publicada, em todo mundo a partir de 1965, é de ressaltar, sobretudo, o sofrimento dessa infeliz mãe de família. Coagida pelas circunstâncias a fugir de seu lar, temendo o que poderia ocorrer a seus filhos pequenos, e claro, acuada em seu próprio país, que deveria ser seu porto seguro, ela não negou o seu instinto natural de sobrevivência, e lutou como uma leoa, até mais que os próprios soldados, eu penso. Não sei como foi o final dessa história, mas o fato é que uma estória bonita, triste e bonita. E mais, nos faz repensar nossos valores e nas ideologias que os dominantes do poder podem nos incutir.

O mais lamentável de tudo é que enquanto existem mães desesperadas tentando salvar seus filhos, crianças apavoradas por não conseguirem se defender, alguns poucos honestos tentando mudar o mundo, existe alguém, do outro lado, erguendo um império próprio, particular, do tamanho da sua vaidade. E para isso, ele tem que ser insensível e egoísta. O nome dele é Senhor da Guerra. E ele ‘não gosta de crianças’.

14 de abr. de 2009

Entre a Fidelidade e o Amor

Amar é ser fiel a quem nos trai, o Nelson Rodrigues é sempre sarcástico, ele coloca o dedo na nossa ferida, afinal, a fidelidade e os amores estão sempre em uma suposta guerra eterna.

Nunca vi uma definição de amor que seja mais forte, mais exigente e mais verdadeira. Um sentimento salvo de qualquer condicionalidade, salvo da armadilha da reciprocidade. Acredito que amar seja exatamente isto, uma lealdade incondicional, um comprometimento cego .

Estas são espécies de definições que tocam nossa alma. Afinal, em um contrato, quando acontece o descumprimento de uma das partes a outra fica automaticamente desobrigada de manter a sua. Amar é o reverso de tudo que julgamos normal ou natural, é a contestação de todas as convenções. É a sabotagem dos planos feitos para ninar nosso egoísmo, é uma inversão de valores. Uma luta contra os mecanismos de auto-sobrevivências que imperam por milênios na existência humana. Amar não é apenas ser fiel a alguém, é ser fiel a um sentimento, um sentimento que se personifica.

Amar é mesmo diante de alguns deslizes do outro, você não pensa em se vingar e não o humilhe com exigências de desculpas, é quando os erros dos outros não comprometem os projetos que fizeram juntos. Amar é compreender plenamente a Teoria Heliocêntrica de Copérnico, existe outra coisa em torno do o qual meu mundo gira. . Amar é não se resignar as limitações, porém sem que isto comprometa a admiração infinita que sem tem pelo outro.

Fidelidade e amor parecem ser palavras quase sinônimas para o Nelson, talvez mais, amor e verdade. Não posso discordar dele, acredito que toda verdade tem um núcleo de amor e todo amor pode ser tomado com um modelo atômico de milhares de afetos girando em torno de um núcleo de verdade.



Minha pequena Ditadura das novidades

É madrugada, deveria estar dormindo, é o que a maioria das pessoas fazem agora. Sinceramente fazer o que a maioria das pessoas fazem é coisa que nunca me encantou. Ficar com a maioria é estar amordaçado ao convencional. Não suporto rotinas, preciso de coisas novas, minha liberdade não admite algemas. Estar com a maioria pelo menos nos sistemas democráticos significa vencer, mas, nem mesmo o sabor doce das vitórias me ilude. Não que seja íntimo das derrotas, pelo contrário, minha vida é a demonstração clara que derrota alguma pode me vencer.

O fato é que vivi quase toda minha vida fazendo coisas que deram errado, me orgulho disto, e que me tornando amigos dos meus erros, eles me educaram para errar, penso que isto tenha sido a coisa mais certa que fiz na vida, preparar-me para errar.

Preparar-me para errar foi a forma que dominei a minha necessidade pelo original. Pessoas que temem errar não arriscam, não tentam coisas novas, ficam aprisionados ao passado. A criatividade nasce desse destemor do fracasso, quem teme fracassar, cumpre rotinas, segue manuais, faz da vida uma receita de bolo, não cria. Dar à luz coisas novas e colaborar com Deus na sua tarefa em nos presentear com a diversidade, é tarefa de quem não tem medo do fracasso e compromisso com o eternamente novo. Habita em mim uma obsessão, de deixar impregnado nas coisas um cheiro de originalidade.

Se existe uma coisa que mais nos torna humanos é a capacidade de inventar e reinventar. Coisas nunca sonhadas, desejos que possam voar, diálogos em línguas que não existiam ainda, amores pescados vagando pelos ares, lágrimas por dores que não existem . Eu penso como o Pessoa “o inventor é um fingidor”.

Eu sou como o Manoel de Barros

Não agüento ser apenas um sujeito que abre portas, que puxa válvulas, que olha o relógio, que compra pão às 6 horas da tarde, que vai lá fora, que aponta o lápis, que vê a uva etc. etc.
Perdoai.
Mas eu preciso ser Outros.”

Pessoas diferentes dizendo as mesmas frases significam coisas novas. Eu sou um obsecado pelo sempre novo. A definição de paraíso para mim seria isto “uma maravilha sempre nova, instante a cada instante para toda eternidade”. A palavra evangelho significa boa nova, só um ser divino usaria uma palavra destas, afinal, uma coisa começa a deixar de ser boa na medida que deixa de ser nova.

Esta eterna novidade, que o Pessoa conclama, faz de nós seres novos. Os atores medievais eram impedidos de serem enterrados em cemitério públicos, acreditava-se que eles só poderiam ter pactos demoníacos, afinal, como alguém poderia ser ele mesmo e ao mesmo tempo ser "Outros".

Este é meu desejo, queria um cemitério que fosse só meu , “e que eu preciso ser outros ...”

10 de abr. de 2009

Os versos que te fiz




Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que a minha boca tem pra te dizer!
São talhados em mármore de Paros
Cinzelados por mim pra te oferecer.

Têm dolência de veludos caros,
São como sedas pálidas a arder...
Deixa dizer-te os lindos versos raros
Que foram feitos pra te endoidecer!

Mas, meu Amor, eu não tos digo ainda...
Que a boca da mulher é sempre linda
Se dentro guarda um verso que não diz!

Amo-te tanto ! E nunca te beijei...
E nesse beijo, Amor, que eu te não dei
Guardo os versos mais lindos que te fiz!

(Florbela Espanca)

25 de mar. de 2009

Da Vaidade

“A vaidade é definitivamente meu pecado predileto”.
Sentenciou o diabo, interpretado com maestria por Al Pacino, no filme “O advogado do diabo”. O filme relata com muita riqueza o que uma pessoa é capaz de fazer para satisfazer a sua vaidade, o seu orgulho, e notadamente, a vontade do homem de possuir poder e os sacrifícios que faz para tê-lo.

De ver-se que a vaidade é um adjetivo oscilante, ou seja, é como uma moeda, logo, pode ser vislumbrada por dois lados. O primeiro é bom, é a vaidade saudável, a vontade de querer se sentir belo, de buscar um ideal, vencer na vida. Poder-se-ia dizer, talvez, que ela é compatível com a dignidade, que é um direito universal, já que todos possuem gostos e talentos próprios e querem satisfazê-los. Vem do amor próprio, do sonho.
Agora a outra face da moeda é um tanto perigosa. É a vaidade figurando-se como um grave pecado capital, evidenciada na busca pelo poder. No entanto, esta busca é revestida de cobiça, é inescrupulosa. É a auto-estima doente, é a necessidade viciada de buscar todas as atenções, trazer todo o poder para si.

Talvez a vaidade seja um pecado que graça sobre toda a humanidade. Tanto que já ouvi várias vezes que ‘se quiser conhecer uma pessoa dê poder a ela!’. E é por isso que é preciso ter muita cautela. Cautela para com os meios para satisfazer a vaidade e para não se ludibriar demais com os luxos que o dinheiro trás. Cautela para com a vaidade e suas diversas dimensões, a vaidade da beleza, do dinheiro, da sabedoria e do poder.

Um exemplo clássico é encontrado na Bíblia. Adão foi o primeiro homem a entregar-se à sua vaidade. Depois que Eva foi convencida pela serpente a juntar-se a seu companheiro e comer o fruto proibido, o pobre Adão não resistiu aos apelos da mulher. Não obstante possuísse o poder de desfrutar do Jardim do Édem, de sorte a comer todos os frutos de qualquer uma das árvores, a exceção daquele proibido pelo seu Criador, Adão foi desobediente, e invejoso até, não negou a sua condição humana e deu-se por insatisfeito, infrigindo a ordem divina. Desejou mais. Imaginou que se comesse o fruto proibido tornar-se-ia deus, e logo, conhecedor de todo bem e todo mal. O preço pela sua vaidade foi a expulsão do paraíso.

Muito embora tenha sido o primeiro homem a render-se à sua vaidade, Adão não foi o último. É que a vaidade existe também em vários níveis de moderação. Quem assistiu ao filme “O Senhor dos Anéis” se lembra da inquietação que pairava sobre qualquer um que se aproximava do anel. É que aquele que o possuísse seria senhor uno e absoluto de toda a Terra Média. Diante daquele pequeno objeto, olhos saltitantes de desejo brilhavam, e o pior, a mera possibilidade de possuir o anel, causava transformações passíveis de delírios.

E mesmo dentro dos corações mais nobres, às vezes a vaidade consegue transparecer-se, eu diria que como uma ‘pitadinha de pimenta’, uma ‘alfinetada’. Não raro conhecemos pessoas extrovertidas, inteligentes, detentoras de uma retórica impecável. Todos os olhares se voltam para ela! Entretanto, pode ser que no fundo de si, reine uma profunda insegurança fruto de algum trauma trazido da infância ou adolescência. Talvez sentir-se admirado seja uma arma para amenizar uma eventual chaga do coração.

Isso tudo me lembra a afirmação muito acertada de Jonathan Swift: "Repetem-nos na escola: 'A vaidade é o prato dos parvos'. Mas os sábios também condescendem em comer dele muitas vezes."

11 de fev. de 2009

Da Solidão

“Para me amar é preciso amar primeiro a minha solidão”. Rubem Alves escreveu esta frase no conto “Barbazul”, um dos textos do livro “Cantos do Pássaro Encantado”. Quando li me senti emocionada, como que minha alma fosse acariciada.

Pois bem. Nesse texto, o grandioso Rubem Alves narra a história de Barbazul, um homem de muitos amores e que só permitiu que uma mulher adentrasse em sua vida com plenitude, quando descobriu que ela o respeitaria em seus momentos de solidão. Respeitaria os momentos em que ele ficasse a sós com seus discos e filmes. Quando ele quisesse parar e refletir sobre a vida ou apenas admirar o nascer do sol ou a calmaria de uma tarde no campo.

Mas o fato é que esse texto veio corroborar o que eu há muito já acreditava e sonhava para minha vida. O “Barbazul” me fez refletir sobre os relacionamentos que tenho presenciado. Às vezes, as pessoas não são movidas pelos ciúmes do parceiro, em virtude do medo de sabê-lo nos braços de outrem. Mas é o medo da felicidade do parceiro que as invade por completo. Medo de sabê-lo feliz lendo um livro, de saber que existem amigos que o divertem ou que outras pessoas possam sentir o brilho do seu sorriso, do mesmo modo que ela o percebeu. Medo da atenção compartilhada, de imaginar mesmo de longe, que ela pode estar feliz através de outros meios que não seja a sua companhia.

Ou ainda, por outro lado, o desrespeito em relação aos momentos de tédio que todos passam. Aqueles momentos em que o parceiro fica taciturno, mergulhado em perguntas sem respostas, avesso a festas e comemorações.

Talvez seja a partir desse ponto que o relacionamento vai mitigando. Pelo desrespeito à individualidade do outro, e, notadamente pelo desrespeito à sua solidão. Solidão esta que deve ser enxergada como algo positivo, e não como um fardo, já que é temida pela maioria das pessoas.
Ora, alguns preferem se curvar a um relacionamento frustrante e tormentoso a imaginar-se sozinho. É o pior de tudo é não saber que a pior sensação não é estar desacompanhado, mas sim, estar só, pesadoradamente só, em meio a multidão. Estar só mesmo acompanhado e temendo estar desacompanhado por não se suportar. É a sensação de se sentir “uma prateleira repleta de frascos vazios”, como acertadamente escreveu Fernando Pessoa.

Mas, com efeito, devemos admitir que atravessamos a vida toda sozinhos. Nascemos e morremos sozinhos. Nunca teremos certeza se alguém nos acompanhará pela vida toda. Então, o ideal é aceitar a solidão como algo inerente à nós mesmos, e a partir desse raciocínio, buscar realizar nossos sonhos e resolver as adversidades com garra, sem depender tanto dos outros, na medida do possível, é claro.

4 de fev. de 2009

Sobre certezas e dúvidas

Vivemos sob o reino das certezas e é esse legado que a ciência moderna tem nos deixado sobre o mundo. Nunca soubemos mais sobre mundo do que sabemos agora. Sabemos de que elementos são constituídos todo e qualquer material, quantos anos tem o universo e que o mesmo está em expansão acelerada. Sabemos que existem 17 bilhões de insetos para cada pessoa. Mas, será que saber tudo isso nos orgulha? Tudo porque somos os únicos animais com a capacidade de refletir sobre nós mesmo?

Ora, as nossas certezas são currais onde as preocupações ficam presas. É que presas elas não oferecem perigo e não saber é muito angustiante. Um turbilhão de questionamentos nos inquieta nossa vida tão frágil. A que horas os ônibus vai passar? Eu aplico na bolsa ou compro imóveis? Fazemos uma viagem ou nos divorciamos?

Contudo, a certeza nos engessa, nos algema em eternas rotinas, afinal, por que mudar, se desse modo, tudo vai terminar bem? As certezas nos amaldiçoam ao criar padrões para o nosso cotidiano, fazendo da nossa vida uma equação matemática chata.

Saber, ter certezas, nos faz sentirmos seguros e nos ajudam a fazer planos. Certezas nos deixam navegar num oceano calmo livres das tempestades da dúvida. Certamente um homem cheio de certezas dorme bem melhor à noite, mas, um homem cercado de dúvidas vive bem melhor durante o dia.

Em 1927, Werner Heisenberg, o controverso físico alemão, talvez o maior depois de Einsten, postulou o “Princípio da Incerteza”, uma idéia segundo a qual é impossível medir simultaneamente e com precisão absoluta a posição e a velocidade de uma partícula, isto é, a determinação conjunta do momento e posição de uma partícula. Este princípio teve repercussão filosófica enorme, pois rompia com a idéia determinística de mundo e nos introduzia num mundo probabilístico, onde acontecimentos tinham apenas grandes possibilidades de se realizarem, mas, era impossível sermos envolvidos pela certeza. Heisenberg nos devolveu a emoção de viver. Nos colocou de novo no mesmo sentimento do homem das cavernas, nos trouxe de volta a vocação humana de navegarmos num mar de imprecisões e erros, nos chamou de volta ao nosso corpo o espírito do qual nos tornou o que somos, qual seja, seres atormentados pelo imprevisível.

Ter dúvidas nos move, nos faz buscar soluções. Ter dúvidas faz criar caminhos. Duvidar faz a nossa vida miserável e monótona valer a pena. Quem tem dúvidas não se paralisa. Sócrates tinha horror a certezas, por isso sempre declarava que a única coisa que sabia e que não sabia nada. Não me estranha o oráculo de Delfos ter declarado ele o mais sábio dos homens.

A dúvida nos premia com pureza de intenções, pois sem certezas o espírito julga sem pressões ou preconceitos. O Humberto Gessinger, líder e letrista da banda “Engenheiros do Hawaii” pensa de forma semelhante a minha, pois escreveu em uma das suas canções. Eu posso estar correndo pro lado errado, mas a dúvida é o preço da pureza e é inútil ter certeza.”

Termino este texto com muitas dúvidas sobre escrever mais sobre isto. Tenho uma certeza e é a mesma de Descartes, o “pai de um método científico”, esse tipo de questionamento lhe assombrava. “A dúvida nos possibilitava um núcleo de certeza... Se duvido, penso”

13 de jan. de 2009

A beleza da dor




Em 2001, Erick Refner ainda um estagiário no Jornal Berlingske Tidente da Dinamarca, resolveu cobrir a situação dos refugiados do Afeganistão, que à época era pouco comentada.

Conforme contido em seu próprio depoimento, o jornalista esteve em um campo de refugiados perto da cidade paquistanesa de Peshawar, próximo à fronteira com o Afeganistão, onde permaneceu por aproximadamente duas semanas. Ali havia cerca de 90 mil refugiados, tanto por conta da situação política, quanto pela seca no norte afegão.

Certo dia, soube que havia morrido um menino de um ano de idade no campo. A família, então, foi à barraca da “ONG Médicos Sem Fronteiras” e solicitou um abrigo branco e uma lápide.

De acordo com a tradição, são os homens que preparam o corpo do infante para o sepultamento. Neste caso, era o pai do bebê, o irmão e uma irmã. São estes os braços que dá para ver na imagem.

Naquela ocasião, Erick após dar os pêsames à família, perguntou se poderia tirar fotografias. E assim agiu o fotógrafo. Não obstante o fato de se encontrar em uma situação difícil, já que a família estava muito emocionada e ainda podia-se ouvir mulheres chorando em outras tendas, Erick Refner obteve êxito em seu propósito, sem ser hostil aos sentimentos daquela infeliz família.

Posteriormente ao término do preparo do corpo, todos saíram da tenda e os homens o carregaram por cerca de 2 km para um cemitério fora do campo.

A foto foi a vencedora do World Press Photo de 2001. Os juízes do World Press Photo descreveram a imagem como “simbólica e icônica”. E de fato é uma imagem muito marcante. Simples, mas, dotada de muita força.

De acordo com os dizeres do próprio Erick Refner: “Tem o grande contraste entre o manto branco e os braços escuros. A criança parece ter um pequeno sorriso no rosto, como se finalmente tivesse conseguido ir a um lugar melhor.Também tem o fato de que são pessoas de mais idade enterrando uma criança, deveria ser o oposto. Tem muito simbolismo nesta imagem. Tudo isso a torna muito poderosa.”.

Mas a Fotografia, como arte, realmente tem esse poder. Captar o sentimento do momento. Demonstrar que uma cena pesadoradamente triste pode ser enxergada, com a captura daquele momento fatídico, como algo dolorosamente belo. É que a beleza também existe nas situações tristes. Como certa feita proferiu Pierre August Renoir: “A dor passa, mas a beleza permanece.”.

 
©2007 Elke di Barros Por Templates e Acessorios